Os tempos sombrios
ainda ecoam ultrapassando os limites do bom senso e irrompendo pelo discurso de
ódio proclamado por considerável parcela da sociedade que aclamam a volta da
violenta intervenção militar. Tal pensamento deturpado pode derivar da
ignorância, do medo, do fundamentalismo, do oportunismo. Seja o que for - COVARDES NÃO PASSARÃO!
As marcas estão aí na
sociedade em geral, basta observar... e nós do Cine Molotov seguimos em mais
uma sessão promovendo reflexões dentro dos pressupostos de memória, justiça e
verdade para manter acesa a chama da esperança.
O recorte pretendido no filme de Antônio Pedrosa Jr.,
Subversivos Anônimos, busca resgatar a história de militantes dos movimentos
populares que foram punidos pelos regimes ditatoriais brasileiros. O autor nos
traz depoimentos daqueles que participaram
militando contra a ditadura nos movimentos sociais, nas associações populares
da cidade de Bauru (SP), que sofreram perseguições, prisões e tortura. Uma
cidade do interior paulistano, que era ponto de referência pelas lutas da classe
trabalhadora e pela formação de novas lideranças populares, contava com a União
dos Ferroviários da estrada de ferro sorocabana.
Quando veio o golpe de 64, o primeiro movimento foi
tirar de circulação as lideranças que poderiam conspirar ou fazer alguma
oposição aos golpistas. A classe operária/ferroviária era a mais atuante e mais
organizada naquele momento, sendo alvo certo para repressão paranoica do regime
militar.
O próprio autor em depoimento faz um relato da
repercussão da morte do jornalista Vladimir Herzog nos porões do DOI CODE, cuja
simulação mal feita de suicídio chocou a sociedade civil, que passou a se
mobilizar, ficando mais atenta ao que se passava e clamando por anistia dos presos políticos e pela volta
dos exilados.
São histórias de pessoas corajosas, histórias
complexas, histórias de lutas, homens valorosos como pouco se vê nos dias de
hoje, abnegados pela liberdade, pela democracia. Dos bravos que resistiam, que
ousaram lutar, mesmo em considerável desvantagem, contra forças armadas,
autoritárias e arbitrárias que se instalavam perigosamente.
Subversivos destemidos, sonhadores, se articulavam
diante dos dispositivos militares.
Ousavam enfrentar o governo estabelecido em
nome das utopias. Subversivos são os contrários a ordem estabelecida,
libertários, revolucionários. Destroem conceitos, quebram paradigmas. Sujeitos
moldados para se opor a opressão do sistema. Espíritos transgressores diante do
autoritarismo mascarado sob a aparente legalidade constitucional. Subversivos
que sangraram nas masmorras ditatoriais em busca de liberdade.
Nas teses sobre a Filosofia da História, Walter
Benjamin fala do quadro de um anjo (Angelus
Novus) cujo olhar parece afastar-se daquilo que está olhando fixamente. “Os
seus olhos estão escancarados, a boca está aberta, as asas desfraldadas. Tal é
o aspecto que necessariamente deve ter o anjo da história. O seu rosto está
voltado para o passado. Onde ali para nós parece haver uma cadeia de
acontecimentos, ele vê apenas uma única e só catástrofe, que não para de
amontoar ruínas sobre ruínas e as lança sobre seus pés.
Ele queria ficar,
despertar os mortos e reunir os vencidos. Mas do Paraíso sopra uma tempestade
que se apodera das suas asas, e é tão forte que o anjo não é capaz de voltar a fechá-las.
Esta tempestade impele-o incessantemente para o futuro ao qual volta as costas,
enquanto diante dele e até ao céu se acumulam ruínas. O que chamamos de
progresso é esta tempestade.
Leo Sampaio – Psicanalista, membro do Cine Molotov
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