Texto produzido para a sessão do filme Utopia e Barbárie
"O
humanismo, a necessidade da arte e o destemor das revoluções
moveram gerações no século XX. Este filme é um recorte de
histórias pós segunda guerra mundial, quando artistas,
guerrilheiros, revolucionários se encontraram numa festa libertária.
Muitos pagaram com suas vidas, outros com suas artes... sonharam e
viveram lutando por um mundo melhor”.
Temos
o prazer de realizar a exibição do documentário histórico UTOPIA
E BARBÁRIE (2009), um trabalho primorosamente complexo do diretor
Silvio Tendler que levou duas décadas para ser produzido, filmado em
quinze países e incrementado com recortes de grandes obras do
cinema, bem como cenas de fatos históricos registrados.
O
autor é também, em alguns momentos, narrador e ao mostrar sua
perspectiva, nos dá uma ideia do que procurou mostrar neste longa
metragem. Tendler afirma ter aprendido num filme do cineasta francês
Jean-Luc Godard que sendo a fotografia uma verdade, na filmagem essa
verdade passar a ser exposta vinte e quatro vezes por segundo. Seu
insight foi compreender que a fotografia era apenas uma imagem e o
cinema uma verdade editada. Assim, o “cineasta dos vencidos”,
como é conhecido, nos revela a perspectiva de um sujeito nascido e
criado no chamado século da imagem, sendo bombardeado pela cultura
de massa, que, no entanto, optou por seguir em contra-fluxo fazendo
cinema engajado, com linguagem crítica, de forma impactante e
independente. Sua arte é sua resistência. Sua obra é espelho dos
fantasmas que perduram no tempo e ainda assombram. Ele traz com
sensibilidade e realismo uma resposta as injustiças, as opressões,
as barbaridades. Atento a importância da memória, lança luz, tanto
nesta, como em outras do mesmo gênero, sobre as sombras recalcadas
do passado que voltam hoje de maneira sintomática.
Conhecer
a história é fundamental, pra quem quer discutir história e,
sobretudo, pra quem quer interferir no mundo futuro, pra quem quer
produzir outro mundo. Aqui é onde nós focamos nas trevas do passado
afim de observar e discutir, pois a memória é um espaço político,
como bem diz um dos entrevistados. Devemos preservar, conhecer as
informações “inconvenientes” que querem ocultar, que tentam
esconder, que querem anestesiar. Outro entrevistado fala justamente a
respeito dessa experiência mental de transitoriedade num fluxo
temporal: Nosso pensamento parte do presente, se dirige ao passado,
reflete como um espelho e se dirige ao futuro”. Campo das utopias
que ao buscarmos, temos nos deparado com as barbáries. A construção
de utopias faz parte da arte de nutrir os sonhos da vida e, nesse
sentido, a compreensão do espírito do tempo precisa ser realizada.
“Confira,
tudo que respira... conspira.
Tudo é vago e muito vario.
Meu destino não tem siso.
O que eu quero não tem preço
Ter um preço é necessário e nada disso é preciso.
Isso de querer ser exatamente aquilo que a gente é...
Ainda vai nos levar além. (Paulo Leminsky)
Tudo é vago e muito vario.
Meu destino não tem siso.
O que eu quero não tem preço
Ter um preço é necessário e nada disso é preciso.
Isso de querer ser exatamente aquilo que a gente é...
Ainda vai nos levar além. (Paulo Leminsky)
Num
período de choques políticos e psicológicos profundos veio 1968 –
o ano mais orgasmico da história – deixando muitas marcas de
lutas, passeatas, protestos estudantis, operários, camponeses,
revolução de costumes, experiências libertárias, numa ebulição
mundial, animados pelas mesmas ideias, pelos mesmos desejos. Diante
das sementes da rebelião, a repressão se fez presente de vários
modos, massacrando... usurpando direitos... interrompendo a
trajetória de luta pela conquista da liberdade.
Leonardo
Sampaio – Psicanalista, membro do Cine Molotov
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